Os Supercondutores
Introdução
A supercondutividade é um dos fenômenos mais fascinantes e promissores da física da matéria condensada. Desde sua descoberta no início do século XX, tem desafiado cientistas e engenheiros a compreender seus princípios fundamentais e explorar suas diversas aplicações. Supercondutores são materiais que podem conduzir eletricidade sem resistência quando resfriados abaixo de uma temperatura crítica específica, o que significa que uma corrente elétrica pode fluir através do supercondutor indefinidamente sem perda de energia.
Uma das grandes corridas científicas atuais é obter um supercondutor que funcione em temperaturas próximas à ambiente. Este avanço revolucionaria diversas áreas tecnológicas e industriais, eliminando a necessidade de resfriamento extremo.
Este artigo, intitulado “Supercondutores: 30 Perguntas e Respostas”, foi elaborado com o objetivo de fornecer um material de estudo abrangente e acessível. Destinado a professores, alunos e entusiastas do assunto, este guia busca esclarecer as complexidades da supercondutividade de forma didática e progressiva. Exploraremos desde os conceitos básicos até as aplicações mais avançadas dos supercondutores na ciência e na tecnologia.
30 Perguntas e Respostas sobre Supercondutores
- O que é um supercondutor? Um supercondutor é um material que pode conduzir eletricidade sem resistência quando resfriado abaixo de uma temperatura crítica específica. Isso significa que uma corrente elétrica pode fluir através do supercondutor indefinidamente sem perda de energia.
- Qual a diferença entre um condutor comum e um supercondutor? Em um condutor comum, como o cobre, há resistência elétrica que causa perda de energia na forma de calor quando a corrente flui. Em um supercondutor, não há resistência elétrica quando o material está abaixo de sua temperatura crítica, permitindo a condução de corrente sem perdas.
- Por que os supercondutores devem estar em temperaturas tão baixas? Os supercondutores devem estar em temperaturas tão baixas porque a supercondutividade é um estado que só se manifesta abaixo de uma temperatura crítica específica para cada material. A essas temperaturas, as interações entre os elétrons e a estrutura atômica do material permitem a formação de pares de Cooper, que são fundamentais para o comportamento supercondutor. Em temperaturas mais altas, a energia térmica é suficiente para quebrar esses pares e interromper o estado supercondutor, fazendo com que o material volte a ser um condutor normal com resistência elétrica. As baixas temperaturas reduzem a energia térmica e permitem a manutenção das condições necessárias para a supercondutividade.
- O que é a temperatura crítica (Tc) em supercondutores? A temperatura crítica é a temperatura abaixo da qual um material se torna supercondutor. Acima dessa temperatura, o material perde suas propriedades supercondutoras e volta a se comportar como um condutor normal.
- Quais são alguns exemplos de materiais supercondutores? Alguns exemplos de materiais supercondutores incluem o mercúrio, chumbo, nióbio-titânio, cerâmicas à base de óxidos de cobre (como YBa2Cu3O7, conhecido como YBCO), e mais recentemente, materiais como hidretos sob alta pressão.
- Como foram descobertos os supercondutores? Os supercondutores foram descobertos em 1911 pelo físico holandês Heike Kamerlingh Onnes, que observou que o mercúrio, quando resfriado a 4,2 Kelvin (-268,95 °C), perdeu completamente sua resistência elétrica.
- O que é o efeito Meissner? O efeito Meissner é a expulsão completa de campos magnéticos do interior de um supercondutor quando ele entra no estado supercondutor. Isso faz com que os supercondutores sejam perfeitos diamagnetos.
- Quais são as aplicações práticas dos supercondutores? Supercondutores são usados em diversas aplicações, como em aparelhos de ressonância magnética (MRI), trens de levitação magnética (maglev), computadores quânticos, aceleradores de partículas, e sistemas de transmissão de energia elétrica sem perdas.
- No celular tem supercondutores? Atualmente, os celulares não utilizam supercondutores em seus componentes. Os dispositivos móveis, como smartphones, são construídos com materiais semicondutores, como o silício, que são adequados para as temperaturas e condições de operação típicas desses dispositivos. Supercondutores, por outro lado, requerem temperaturas extremamente baixas para funcionar, o que torna seu uso impraticável em eletrônicos de consumo diário, como celulares.
- O que são semicondutores? Semicondutores são materiais que possuem propriedades elétricas intermediárias entre os condutores (como metais) e os isolantes (como vidro). A condutividade elétrica de um semicondutor pode ser controlada por vários fatores, incluindo temperatura, impurezas adicionadas (dopagem) e campos elétricos. Exemplos comuns de semicondutores incluem o silício e o germânio. Esses materiais são fundamentais para a fabricação de dispositivos eletrônicos como transistores, diodos e circuitos integrados, que são componentes essenciais em computadores, smartphones e outros aparelhos eletrônicos.
- Qual a diferença de um semicondutor para um condutor? A principal diferença entre um semicondutor e um condutor está na sua capacidade de conduzir eletricidade. Condutores, como cobre e alumínio, possuem uma grande quantidade de elétrons livres que permitem a fácil condução de corrente elétrica. Esses materiais têm baixa resistência elétrica e conduzem eletricidade eficientemente em diversas condições. Em contraste, semicondutores possuem uma quantidade muito menor de elétrons livres em condições normais, resultando em uma maior resistência elétrica comparada aos condutores. No entanto, a condutividade dos semicondutores pode ser modificada de maneira controlada através de processos de dopagem (adição de impurezas específicas) e pela aplicação de campos elétricos ou luminosos. Essa capacidade de controlar a condutividade é o que torna os semicondutores tão valiosos na eletrônica moderna, permitindo a criação de componentes que podem amplificar sinais elétricos, armazenar dados e realizar operações lógicas essenciais para o funcionamento de dispositivos eletrônicos.
- O que são supercondutores de alta temperatura? Supercondutores de alta temperatura são materiais que se tornam supercondutores a temperaturas relativamente mais altas do que os supercondutores tradicionais, embora ainda sejam bastante baixas em termos absolutos. Por exemplo, YBCO tem uma temperatura crítica de aproximadamente 93 Kelvin (-180 °C).
- Como os supercondutores podem melhorar a eficiência energética? Supercondutores podem melhorar a eficiência energética ao permitir a transmissão de eletricidade sem perdas, o que poderia reduzir significativamente o desperdício de energia em redes de distribuição elétrica.
- O que são pares de Cooper? Pares de Cooper são pares de elétrons que se movem juntos através de um supercondutor sem resistência. Essa formação de pares é fundamental para a ocorrência da supercondutividade, conforme descrito pela teoria BCS (Bardeen-Cooper-Schrieffer).
- Quais são os desafios na utilização de supercondutores em larga escala? Os principais desafios incluem a necessidade de resfriamento a temperaturas extremamente baixas, o custo elevado dos materiais supercondutores e a complexidade de fabricá-los e mantê-los em condições operacionais.
- O que são supercondutores de segunda geração (2G)? Supercondutores de segunda geração (2G) são feitos com fitas de cerâmica de alta temperatura, que são mais eficientes e robustos em comparação com a primeira geração (1G) de supercondutores de fio metálico. Eles são utilizados em aplicações avançadas como cabos de energia e motores.
- Qual foi a maior temperatura que se obteve um supercondutor? A maior temperatura em que se obteve supercondutividade foi alcançada em hidretos sob alta pressão. Em 2020, cientistas anunciaram a descoberta de um supercondutor de hidreto de enxofre-carbono que apresenta supercondutividade a cerca de 15 °C (288 K), sob uma pressão de aproximadamente 267 gigapascais (GPa), que é cerca de 2,6 milhões de vezes a pressão atmosférica da Terra ao nível do mar. Este resultado representa um avanço significativo, pois aproxima a supercondutividade das temperaturas ambientes, embora ainda dependa de condições de pressão extremamente altas, tornando a aplicação prática um desafio. Antes dessa descoberta, os supercondutores de alta temperatura mais conhecidos eram materiais cerâmicos à base de cobre (cupratos), como o YBa2Cu3O7 (YBCO), que têm uma temperatura crítica de cerca de 93 Kelvin (-180 °C) em pressão ambiente. Estes materiais ainda exigem resfriamento criogênico, embora menos extremo do que os supercondutores tradicionais de baixa temperatura, como o chumbo ou o mercúrio.
- O que é o resfriamento criogênico e como funciona? O resfriamento criogênico é um processo utilizado para atingir e manter temperaturas extremamente baixas, geralmente abaixo de -150 °C (123 K). Este método é essencial para diversas aplicações científicas e tecnológicas, incluindo a obtenção de supercondutividade em materiais que requerem temperaturas criogênicas para exibir suas propriedades únicas. O resfriamento criogênico funciona utilizando gases como hélio e nitrogênio em estado líquido. O hélio líquido
, por exemplo, pode atingir temperaturas de até 4,2 K (-268,95 °C) sob pressão atmosférica normal, tornando-o ideal para aplicações que requerem resfriamento extremo.
- Como funciona um trem de levitação magnética (maglev) utilizando supercondutores? Um trem maglev utiliza supercondutores para flutuar sobre trilhos magnéticos, eliminando o atrito entre as rodas e os trilhos. Isso permite que o trem atinja velocidades muito altas com maior eficiência energética.
- Qual é o impacto dos supercondutores na pesquisa científica? Supercondutores têm um impacto significativo na pesquisa científica, permitindo avanços em áreas como física de partículas, com o uso de aceleradores de partículas, e na medicina, com a melhoria de imagens de ressonância magnética.
- Os supercondutores podem fazer mal à saúde humana de alguma maneira? Em geral, os supercondutores não apresentam riscos diretos à saúde humana durante o uso normal em dispositivos e aplicações tecnológicas. No entanto, os sistemas que utilizam supercondutores podem envolver campos magnéticos intensos e temperaturas extremamente baixas, que requerem precauções específicas. Por exemplo, exposições prolongadas a campos magnéticos fortes podem afetar dispositivos médicos implantados, como marcapassos. Além disso, o manuseio de materiais supercondutores e os sistemas de criogenia utilizados para mantê-los a baixas temperaturas necessitam de protocolos de segurança rigorosos para evitar lesões por congelamento e outros riscos associados ao uso de gases criogênicos, como hélio líquido.
- Como os supercondutores são utilizados em computadores quânticos? Supercondutores são utilizados em computadores quânticos para criar qubits que podem manter estados de superposição e entrelaçamento quântico, essenciais para a computação quântica. A baixa resistência e o efeito Meissner ajudam a preservar a coerência dos qubits.
- Qual a relação entre supercondutividade e estados quânticos? A supercondutividade é um fenômeno quântico macroscópico que resulta da formação de pares de Cooper e da condensação em um estado de baixa energia, onde muitos elétrons se comportam de maneira coerente.
- O que são supercondutores exóticos? Supercondutores exóticos são materiais que exibem supercondutividade sob condições extremas ou com propriedades incomuns, como supercondutores topológicos que podem ter aplicações em computação quântica robusta.
- Quais avanços recentes em supercondutividade estão na mídia? Recentemente, houve descobertas de materiais que exibem supercondutividade a temperaturas mais altas sob alta pressão, como os hidretos de enxofre e hidrogênio, que podem abrir novas possibilidades para aplicações práticas.
- Qual é o potencial dos supercondutores na revolução energética? Supercondutores têm o potencial de revolucionar o setor energético ao permitir a transmissão de eletricidade sem perdas, melhorando a eficiência das redes elétricas e possibilitando o armazenamento de energia de forma mais eficaz.
- Como a pesquisa em supercondutividade pode impactar o futuro da tecnologia? A pesquisa em supercondutividade pode levar a avanços significativos em diversas tecnologias, incluindo transporte, medicina, eletrônica e computação, possibilitando dispositivos mais eficientes, rápidos e com novas funcionalidades.
- Quanto é o investimento necessário para a obtenção de um supercondutor? O investimento necessário para a obtenção de um supercondutor pode variar significativamente dependendo do tipo de supercondutor e da aplicação pretendida. Para supercondutores de baixa temperatura, como o nióbio-titânio, o custo principal envolve a criação de ambientes de criogenia para resfriar o material a temperaturas próximas do zero absoluto, o que exige sistemas complexos e caros, como aqueles que utilizam hélio líquido. O custo de produção de supercondutores de alta temperatura, como os óxidos de cobre (YBCO), envolve processos de fabricação avançados e controle preciso das condições de crescimento do material, o que também pode ser caro. Em termos de valores específicos, os custos de instalação e operação de sistemas de criogenia podem chegar a centenas de milhares de dólares. O custo dos materiais supercondutores por si só pode variar de algumas centenas a milhares de dólares por quilograma, dependendo da pureza e do processo de fabricação. Além disso, há custos associados à pesquisa e desenvolvimento, infraestrutura, manutenção e operação dos sistemas supercondutores. Em um contexto mais amplo, projetos que utilizam supercondutores em grande escala, como redes de transmissão de energia ou sistemas de transporte maglev, podem requerer investimentos de milhões a bilhões de dólares. No entanto, os benefícios econômicos e as eficiências resultantes do uso de supercondutores podem justificar esses investimentos a longo prazo.
- Atualmente, em que ponto dos estudos sobre supercondutores a ciência encontra-se? A ciência dos supercondutores está em um ponto de intensa pesquisa e descoberta. Recentemente, houve avanços significativos na compreensão dos mecanismos fundamentais da supercondutividade, especialmente em materiais de alta temperatura crítica e supercondutores exóticos. Pesquisadores têm explorado novos materiais, como hidretos sob alta pressão, que exibem supercondutividade a temperaturas mais elevadas, embora ainda abaixo da temperatura ambiente. Além disso, há um foco crescente na aplicação prática de supercondutores em tecnologias emergentes, como computadores quânticos, redes de energia eficientes e sistemas de transporte avançados, como trens de levitação magnética. No entanto, muitos desafios persistem, incluindo a necessidade de resfriamento a baixas temperaturas, a síntese de novos materiais supercondutores estáveis e a escalabilidade dessas tecnologias para uso comercial. A comunidade científica continua a investigar esses aspectos para tornar a supercondutividade mais acessível e aplicável em larga escala.
- Qual é a aplicação mais recente dos supercondutores que está em alta na pesquisa científica? Uma das aplicações mais recentes e em alta na pesquisa científica dos supercondutores é o desenvolvimento de supercondutores de alta temperatura para uso em fusão nuclear. Cientistas do MIT, por exemplo, têm trabalhado em novos tipos de ímãs supercondutores que utilizam um material chamado óxido de bário e cobre de terras raras (REBCO), permitindo que esses ímãs operem a temperaturas mais altas do que os supercondutores tradicionais. Esses ímãs são essenciais para a contenção do plasma em reatores de fusão, que necessitam de campos magnéticos extremamente fortes para manter o combustível em condições de fusão. Outro avanço significativo é a criação de diodos supercondutores de alta temperatura, que têm o potencial de revolucionar a eletrônica e a computação quântica. Esses diodos são fabricados com cristais de cuprato extremamente finos e manipulados em temperaturas muito baixas para manter suas propriedades supercondutoras. Eles podem permitir o controle eletrônico sobre estados quânticos, abrindo novas possibilidades para a computação quântica e a pesquisa de materiais exóticos.
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